Quão absurdo é 'Assassin's Creed Red' ter um protagonista negro?
Em 2022 a Ubisoft anunciou 4 jogos de Assassin's Creed que estavam em diferentes estágios de desenvolvimento pra serem lançados nos próximos anos, mas o jogo que mais chamou atenção do público foi o Codename Red, que finalmente levará os jogadores a explorar o Japão Feudal, período que já é aguardado e prometido há muitos anos.
Recentemente, começaram a surgir rumores fortíssimos com detalhes sobre o jogo, que, sendo verdade ou não, instauraram um caos na comunidade não só de Assassin's Creed, mas da cultura gamer na internet.
O principal rumor afirma que os jogadores poderão escolher jogar entre dois protagonistas, uma Shinobi e um Samurai, com a shinobi sendo uma mulher japonesa e o samurai sendo um imigrante africano.
Eu nem preciso dizer que uma galera foi à loucura com a informação de que o novo jogo da franquia poderia ter um protagonista negro. Claro, sempre atrás da justificativa da "descaracterização" da cultura japonesa, reclamando que depois de anos esperando um jogo ambientado no Japão feudal, sequer jogaríamos com um japonês real (ignorando a outra parte do rumor que também afirma que uma shinobi japonesa seria uma das protagonistas no jogo).
Ironicamente, a ideia de um estrangeiro assumindo o papel de um guerreiro japonês não parece ser um problema quando é Keanu Reeves interpretando um Ronin em 47 Ronin, mesmo o filme sendo ruim.
![]() |
'47 Ronin' (2013) é um filme baseado em eventos reais do Japão no século 18 e está disponível no Star+. |
No mundo dos jogos mesmo, Nioh, exclusivo de Playstation que é muitíssimo aclamado, tem um protagonista Irlandês chamado William Adams e se passa no Japão em 1600.
![]() |
Nioh foi desenvolvido pela Team Ninja e foi lançado em 2017 para Playstation e PC. |
Nem precisamos ir muito longe pra falar sobre estrangeiros protagonizando histórias que adaptam outras culturas. Assassin's Creed Revelations se passa durante o Império Otomano e acompanha Ezio Auditore, um italiano, explorando Constantinopla (atual Istambul, na Turquia), e além de nunca terem reclamado sobre isso, também é um dos melhores jogos da franquia.
Então, por que de repente se torna um problema quando o protagonista é um imigrante africano?
"Porque não é historicamente acurado!"
Mentira de novo, temos registros históricos de um famosíssimo imigrante africano no Japão, que inspirou diversas histórias da cultura pop e até ganhou um anime: Yasuke.
![]() |
Pôster do anime 'Yasuke', disponível na Netflix. |
Figura importantíssima no Japão durante o final do século 16, Yasuke chegou ao Japão em 1579 junto de diversos outros Africanos que eram comercializados pelos Europeus durante o período das negociações de Nanban, quando a coroa Portuguesa monopolizou o comércio Japonês e o tornou exclusividade da Europa.
Yasuke foi comprado pelo senhor feudal Oda Nobunga, simplesmente porque o japonês nunca tinha visto um homem de pele preta na vida e criou um interesse incomum pelo africano. Yasuke foi o único servo estrangeiro do Clã Oda e, com o tempo, foi consagrado Samurai pelo próprio Nobunga, ganhando sua própria residência, uma pequena katana cerimonial e o nome que é conhecido até os dias de hoje (弥助), assumindo o comando do almoxarifado das armas do Clã.
Yasuke lutou a Batalha de Tenmokuzan contra o Clã Takeda e serviu ao Clã Oda até a execução de Nobunga, em 1582, pelo exército de Akechi Mitsuhide, que supostamente entregou Yasuke para a igreja cristã de Kyoto.
Essa é toda a história documentada do primeiro e único Samurai Africano.
Sabendo que Assassin's Creed é uma obra de ficção sem nenhum compromisso com a realidade, não seria nenhum absurdo a franquia nos colocar pra jogar com um hipotético segundo Africano que se tornou Samurai por algum Clã do Japão Feudal durante as negociações de Nanban, ou com algum tipo de descendente de Yasuke, assim como jogamos com Kassandra e Alexius, os netos fictícios do Rei Leonidas de Esparta, em Assassin's Creed Odyssey.
![]() |
Alexios e Leonidas se encontram nos Campos Elísios durante a quest "A Life for a Life" no Episódio 1 da DLC "O Destino de Atlântida". |
No fim, toda a problemática em volta de uma informação que pode sequer vir a ser verídica, não passa de mais um caso de racismo velado da comunidade gamer. Essa não é a primeira vez e nem será a última que viremos denunciar e destrinchar um caso assim no mundo dos jogos.
Particularmente, eu espero que o rumor de dois protagonistas seja verdade, porque além de isso já ser um padrão há uns anos em Assassin's Creed (começando com Evie e Jacob em Syndicate, e recentemente com Alexios e Kassandra em Odyssey e Havi e Eivor em Valhalla), pode nos dar duas visões completamente opostas de um mesmo período histórico, aumentando o valor de replay do jogo e lidando com ainda mais representações culturais, além do fator identificação, que se expandiria pra homens negros e mulheres asiáticas.
![]() |
Jacob e Evie Frye são a dupla protagonista de 'Assassin's Creed Syndicate', onde acompanhamos os gêmeos na Londres Vitoriana durante o auge da 2ª Revolução Industrial. |
Assassin's Creed Codename Red ainda não tem previsão de lançamento, mas a Ubisoft ainda tem 2 jogos de Assassin's Creed pra lançar nesse fim de 2023: O beta fechado do Codename Jade, novo jogo pra celulares da franquia ambientado na China Antiga, ocorre de 3 a 11 de Agosto com jogadores selecionados aleatoriamente, e o aguardadíssimo Mirage, que é um prequel de Valhalla, finalmente lança pra Playstation 4 e 5, Xbox One e Series e PC no dia 12 de Outubro.
– Tiago Sampaio
Comentários
Postar um comentário