O Quarto ao Lado: A reflexão de Almodóvar sobre a morte | REVIEW QUE NINGUÉM PEDIU
Às vezes, no meio do nosso mundinho geek, ter assistido a um filme um pouco fora desse nicho faz você parecer muito culto, até massageia o ego e dá aquele leve ar de superioridade na mente. Mas, de vez em quando, se é lembrado de que majoritariamente, a maioria das coisas que assistimos, mesmo se achando bem prolixo, é americana.
Isso, claro, porque é o que acaba sendo mais vendido, distribuído e anunciado, ao ponto de haver brasileiros que nunca assistiram a um filme brasileiro. Além do nacional, é fácil esquecer da existência do cinema italiano, do indiano ou do espanhol, sendo o caso daquele que vos fala, que nunca havia assistido a um filme de Pedro Almodóvar até semana passada (agora é o momento do seu ego ser massageado e ter seu ar de superioridade, com razão).
Como você já está vendo, e verá nas semanas seguintes, estamos abrindo um pouco o leque de assuntos aqui no blog. Isso não só é benéfico para nós, como também esperamos que incite o interesse em você leitor, que talvez não esteja querendo expandir os horizontes. Mas enfim, vamos para O Quarto ao Lado.
O filme, que estreia dia 24 de outubro nos cinemas, conta a história de Ingrid (Julianne Moore) e Martha (Tilda Swinton), duas amigas que se reencontram após anos sem se falar. Martha está com câncer incurável, e depois do tratamento de químio não ter surtido resultados positivos, pede a Ingrid para passar um tempo com ela no quarto ao lado de uma casa no campo até o momento em que ela decidir se matar. Baseado no livro “What are you going through” de 2020, escrito por Sigrid Nunez.
Não é surpresa para ninguém que conhece alguns filmes de Almodóvar que ele gosta de tratar de certos assuntos: mulheres, mães e filhos querendo saber sobre os pais. E é de bom grado que digo que tudo isso é tratado nos primeiros 10 minutos de filme, quase como se ele quisesse tirar logo isso de seu sistema para focar no que ele realmente queria discutir: a morte e como lidar com ela.
Almodóvar parece dividir suas próprias reflexões do tema em 3 personagens: Ingrid, que tem medo da morte, ela começa o filme não aceitando como algo vivo pode morrer; Martha, alguém que já aceitou a morte, lutou com ela, mas decidiu sair nos próprios termos; e Damian (John Turturro), palestrante sobre o aquecimento global e os problemas ambientais (assunto já tocado por Pedro em produções passadas), que desistiu da possibilidade de um futuro melhor.
Mesmo com o tema mais deprimente, o filme não se esquiva de momentos leves e bem-humorados. Infelizmente, como o bom humor, também não se aprofunda emocionalmente até onde poderia, e até onde o diretor já foi, não aliviando o ritmo lento com um engajamento mais ativo. Me veio a mente O Menino e a Garça de Miyazaki, também um filme lento e reflexivo da vida de um diretor, porém esse longa não possui nada tão forte como a animação de Miyazaki para sustentar e reforçar o seu ritmo e seus temas. De qualquer forma, não se pode negar que esse é um filme Almodóvar de corpo e alma.
Esse é o primeiro longa de Almodóvar completamente na língua inglesa, mesmo sendo uma produção majoritariamente da Espanha, e não sei ao certo se isso foi para o benefício do filme. Porém, esse é mais um sentimento pessoal que percorreu pelo filme do que algo concreto para criticar. A cinematografia é mais discreta, porém captura a emoção das cenas muito bem, e faz as paisagens brilharem. A trilha de Alberto Iglesias faz o seu trabalho, definindo o tom e guiando o telespectador, o que em qualquer outra década seria algo redundante, mas hoje em dia nem tanto.
Mesmo com seu ritmo mais lento, o filme não se estende o suficiente para este se tornar um martírio. Pedro Almodóvar continua a escrever mulheres muito bem e a direção se mantém impecável, e seus temas e discussões ficam contigo depois dos créditos rolarem, mas algo se perdeu no peso emocional em um filme cuja mensagem é extremamente pessoal.
VEREDITO: ★★★½
Gostaria de salientar que este filme, apesar do meu primeiro pensamento ao ler a sinopse, não é sáfico! Mas ainda assim Almodóvar segue incluindo histórias LGBTQIA+ em seus filmes. O bom de filmes que são mais subjetivos com seus temas, principalmente quando se trata da morte, é que cada um sentirá algo um pouco diferente. Para você, o ganho emocional pode estar aqui, e por conta disso é uma recomendação. Além de, claro, um novo filme de Pedro Almodóvar!
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