O Brutalista: A construção de uma narrativa épica | REVIEW QUE NINGUÉM PEDIU

 


Nessa quinta-feira, 20 de fevereiro, estreia finalmente nos cinemas brasileiros O Brutalista, um drama que, por mais que sua chegada não tenha causado algum tipo de conflito no quesito de desmoralizar um povo, ou não ter causado uma sensação de “Copa do Mundo” ao seu país (até porque é um filme estadunidense), ele vem conseguindo se posicionar entre os filmes de prestígio ao receber diversas indicações entre as premiações que ocorrem neste primeiro trimestre do ano — além de ter caído no gosto dos críticos e do público. Sendo o vencedor de 3 das 5 categorias em que foi indicado no Golden Globes (e recebendo 10 indicações ao Oscar), o longa utiliza-se de elementos épicos e constrói uma narrativa histórica. A convite da Universal Studios, tivemos a oportunidade de assistir ao filme antes do seu lançamento e analisar como a história se encaminha naquilo que se propõe trazendo elementos únicos, ainda que seguindo uma espécie de fórmula que se assemelha a outro material cinematográfico, causando uma inevitável comparação entre eles…  

 Se assim como eu (prazer, Clara) você gosta de assistir ao filme completamente às cegas, acho melhor você pular esse parágrafo e retomar a leitura a partir do próximo parágrafo (onde tentarei dar menos informações que entreguem muito sobre o filme). Dirigido pelo ator e diretor Brady Corbet, a trama conta a história de um arquiteto judeu húngaro chamado Lászlo Tóth (interpretado por Adrien Brody) que em 1947, após os catastróficos acontecimentos causados pela 2ª Guerra Mundial, consegue sair da Europa em direção aos Estados Unidos, onde ele consegue refúgio para tentar uma nova vida para ele e sua família composta por sua mulher (Erzsébet; interpretada por Felicity Jones) e sua sobrinha Zsófia (Raffey Cassidy). De início, ele é recebido por um primo que havia conseguido se estabelecer no país como um marceneiro, mas tudo muda após um aristocrata se interessar por seu trabalho com a construção de edifícios com a técnica do Brutalismo Arquitetônico e o contrata para a construção de um Instituto para a cidade de Pensylvannia (descrita como a “cidade da família americana”), onde o filme se passa na maior parte do tempo. 

 A história de Lászlo é contada em uma linha temporal de 33 anos de sua vida, desde a chegada dele em 1947 até um pouco antes de sua morte nos anos 80. Muito desse registro, podemos ver seu crescimento profissional em um novo território — ao mesmo tempo que ele lida com a brutalidade do que viveu em seu país de origem e com as dificuldades de sentir que pertence a um país onde você é colocado como um estranho ou constantemente posicionado como um ser inferior. Durante esse tempo, podemos ver o conflito em que ele é inserido: ao mesmo tempo que ele é subjugado como indivíduo, seu trabalho como arquiteto é extremamente relevante para aqueles que estão no território e querem se usufruir do que Tóth consegue trazer para eles: uma arquitetura inovadora para o local. Isso porque ele se formou na Escola de Artes de Bauhaus, uma das pioneiras da arte vanguardista na Alemanha e com seu foco na construção de edifícios que se utilizam do movimento artístico do Brutalismo, que até então só era visto em território europeu. 

ZONA *MAIS OU MENOS* LIVRE DE SPOILER:  

O filme é divido em 3 partes, o que é uma “formatação” bastante comum de se ver. No entanto, algo que gerou muita curiosidade é o fato de o filme ter um intervalo de 15 minutos entre o final da Parte 1 e o início da Parte 2 (eu não sei se isso também ocorrerá nas sessões oficiais do filme, mas acredito que sim). Esse intervalo, que pode muito ser visto de uma maneira negativa, na minha opinião foi uma boa estratégia para o filme, visto que o mesmo tem 216 minutos de duração e essa “quebra” de sequência faz com que o espectador filtre melhor as informações dadas na primeira 1h e 40 min do longa. 

Minhas primeiras impressões sobre o filme foram bem positivas. Desde o início conturbado até o desfecho da Parte I, chamada de “O Enigma da Chegada” o filme conseguiu fazer com que eu me sentisse muito interessada pela história. Isso se manteve durante o segundo ato da história (chamado de 'O núcleo duro da beleza'), visto que o ritmo do filme começa a mudar um pouco mais e ele segue um ritmo mais conturbado com a chegada de “novos personagens” (que até então só haviam sido mencionados) para a narrativa e com o início de conflitos maiores. No entanto, isso vai se perdendo entre a transição do final da segunda parte para o Epílogo (parte 3 e final da trama) onde há uma justificativa para o processo “criativo” do arquiteto. Tudo parece ser entregue meio de bandeja e repentinamente. Apesar disso, o filme consegue nos entreter com o que entrega durante a história. 

Me entreteve tanto que achei que a história fosse baseada em fatos reais. Apesar de parecer uma persona tão realista, o arquiteto de fato nunca existiu — mas há indícios que a história para a trama pode ter sido baseada na vida de outro arquiteto da realidade —. De início, essa informação foi filtrada por mim de um modo negativo (pois meu interesse pelo histórico gostaria de saber mais sobre a vida de Lászlo), mas depois percebi ser um ponto positivo para a construção da narrativa e pela tomada de escolhas que seria realizada ao longo do roteiro e pelo diretor durante o drama épico apresentado. Ele consegue conciliar a influência que a vida pessoal do personagem principal tem sobre a vida profissional dele.

 

Entretanto, como dito no início dessa review, o filme traz uma proposta muito similar a outro filme que foi muito aclamado nos anos anteriores: Oppenheimer. Ainda que eu inicialmente possuísse poucas informações sobre O Brutalista, suspeitei que ele teria similaridades com o filme prévio (e de fato tem). Como ambos se encaixam no gênero de drama épico, eles parecem seguir um padrão bem parecido de conto. Contudo, a dicotomia entre os dois personagens nos apresenta lados diferentes do período histórico retratado: por um lado um personagem já inserido no “sonho americano”, e o outro que almejava alcançá-lo, mas era impossibilitado.

Apesar das similaridades, esse filme consegue trazer elementos originais e combinar cada parte que o constrói de forma harmônica. A dureza apresentada entre os paralelos da vida do personagem com os recursos que o mesmo utiliza em suas construções, também podem ser encontrados na trilha sonora (que é incrível e muito bem elaborada por Daniel Blumberg) e na utilização de cenários e edifícios vistos durante a narrativa. O filme também traz uma projeção de formas e linhas bem elaboradas que podem ser encontradas em diversas partes do decorrer da história. Outro ponto que também trabalha muito bem para a narrativa é o uso e o desuso de luzes que sofre interferências muito bem pensadas no decorrer da obra. O figurino também é um componente do longa que auxilia para seu desenrolar. Apesar de não variar muito o seu modelo de roupa e ter uma padronização de uso de ternos e vestidos, as cores utilizadas se relacionam com cada personagem e seu desenvolvimento. 

Falando em personagens, eles são bem arquitetados e explorados durante a narrativa. A escolha do elenco foi certeira: todos trazem a essência de seus indivíduos de um modo muito natural. Adrien Brody, Felicity Jones, Guy Pearce e os outros profissionais que formam essa equipe, trouxeram características muito bem resolvidas para a trama. Meu destaque pessoal vai também para o Joe Alwyn, que me impressionou com sua interpretação, mas que acabou não recebendo tanta atenção. Um fato comentado sobre o filme, foi a utilização de Inteligência Artificial para corrigir a pronúncia dos atores ao se comunicarem no idioma húngaro. Isso passa um pouco despercebido durante o filme, mas acredito que perde um pouco do orgânico e que se não utilizassem também não faria falta.

 VEREDITO: ★★★★

Pelo fato desse filme se encaixar muito bem nos padrões de filmes nos quais a Academia se interessa, ele pode se sair muito bem durante as premiações, e acredito que o público possa se interessar pela história também. Reiterando o que foi dito, o modo com que esse filme lida com a presença da vida pessoal sendo refletida nas artes, para mim, é um destaque para o enredo, e o brutalismo da vida de Lászlo Tóth conversar com o peso e o impacto de seus projetos é algo que pode ser muito bem analisado. Espero que esse filme tenha o reconhecimento que merece pelos apreciadores da sétima arte. 

Escrito por Clara Silvestre

Revisão por Luisa De Luca e Emilly Lois

 

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