Trilhando as Trilhas | Episódio V: Wicked Parte I


Trilhando as Trilhas

Episódio V:
Wicked Parte I

Já tivemos review e pod, e a Parte 2 ainda está a alguns meses de distância, mas nunca é mal tempo pra falar de Wicked, muito menos sobre sua música.

Se você já está familiarizado com essa série infrequente, sabe que musicais não são muito trabalhados aqui (isso é mais a área do Tiago Sampaio, que promete um bloco só disso), o foco geralmente são as trilhas instrumentais. De fato, não há como se desvencilhar completamente das músicas de Stephen Schwartz, então vou tocar nelas sim, mas o amor vai mais para o John Powell mesmo.

Pra um pouco de contexto, John Powell começou como pupilo de Hans Zimmer, orquestrando e compondo música adicional. Na DreamWorks, em parceria com Harry Gregson-Williams, fez Shrek, Fuga das Galinhas e FormiguinhaZ. Com Hans Zimmer, Caminho para El Dorado e os dois primeiros Kung Fu Panda. Em 2010, compôs seu primeiro esforço solo na DreamWorks com Como Treinar o Seu Dragão. 

Nesse meio tempo, ele já havia sido responsável pela trilogia Bourne, Hancock, Robôs, A Era do Gelo 2 e 3 e Happy Feet, onde trabalhou na produção e orquestração das músicas cantadas além da trilha instrumental. Então, muito provavelmente você já o ouviu muitas vezes.

Schwartz o conheceu em o Príncipe do Egito e, pelo visto, 30 anos depois, isso veio a calhar. Dessa vez, Powell não ficou responsável pelas músicas cantadas, e Schwartz também é creditado pela trilha instrumental, não só por suas melodias estarem por toda ela, mas também por ter dado seus pitacos.

O filme começa com Powell, crescendo com a orquestra em uma ideia sinistra até explodir na mini-Overtura de Schwartz, no tema da Bruxa Má, seguida pelas cordas frenéticas dos macacos alados, inspirado no tema dos mesmos no filme clássico e o tema Unlimited/Na Imensidão, não oficialmente inspirado no tema de Deus do Príncipe do Egito.

Em português porque foi assim que fiz a edição da trilha com as músicas.

No One Mourns the Wicked/Sem Perdão à Bruxa segue como esperado, o coro (Goodness knows, the wicked's lives are lonly) estabelece um motivo que será a base de um original por Powell. Vale ressaltar que a mixagem do álbum das músicas é medonha, é um som extremamente processado e comprimido, não faz muito sentido, mas é o que é.

Arrival at Shiz University, como todo bom prenúncio, já taca suavemente a melodia de For Good/Tudo Mudou no sopro e, depois, no coro, enquanto as cordas e orquestra crescem para a melodia de Unlimited. Os metais sinalizam a chegada à Shiz com a melodia da música em um arranjo grandioso, terminando com os sinos da Glinda em seu tema, um rearranjo da ponte de Popular (Lá Lá, Lá Lá), levando para Dear Old Shiz/Nossa Shiz, formalmente apresentando o tema.

Um susto nos metais e cordas tensas abrem Our Heroes Meet, e então Powell pega a estrofe final do coro de No One Mourn the Wicked em um arranjo divertido (It just shows when you're wicked, You're left only, On your own), cordas e sopro já sinalizam o Ódio assim que o olho bateu, seguindo para o tema da Glinda nas cordas. A faixa termina se divertindo com a imagem, dando sutis relances de outros motivos.

Voltando a melodia de Dear Old Shiz para abrir Nessarose, e as cordas tomam a melodia principal de No One Morns the Wicked em um arranjo lento e um tico triste. Os sinos da Glinda retornam em Meet the Faculty, que também tocam a melodia de Dear Old Shiz (diegética) com uma batida eletrônica no fundo e uma ideia que as primeiras notas do tema da Bondade de Elphaba contrapõe, levando a introdução do tema da Madame Morrible, baseado na pequena parte dela no início de The Wizard and I. Aqui o tema aparece na sua versão mais comum, nas cordas, no sopro e no piano. A  faixa termina com os sinos da Glinda e o sopro acompanhando.

Em Elphaba's Power, mais uma vez encontramos a melodia de Dear Old Shiz, dessa vez uma variação nas cordas com uma batida na percussão que vira um pizzicato, e depois um crescimento para o motivo que começou o filme nos metais, parece significar a magia da Elphaba (ou o Poder, se seguir o nome da faixa). O tema da Morrible retorna tão doce quanto antes, e enquanto as duas conversam, o motivo do Poder é tocado no sopro, na maneira mais otimista até agora, levando ao início de The Wizard and I/O Mágico e Eu. A música além de estabelecer motivos que serão e já foram utilizados, resgata Unlimited/Na Imensidão na ponte.

Fazendo o máximo de uma música meio irrelevante, Powell inicia How to Loathe Your Roomate com Dear Old Shiz, logo o início dela (a quantidade de variação que ele arranja de uma música bem curta é impressionante), mas o motivo da Glinda já entra em cena, bem mais Popular que anteriormente, utilizando os sinos e as cordas dinamicamente. No decorrer da faixa, uma nova ideia, parecida com o tema do Poder em um tom mais alegre, é introduzida. E temos What Is This Feeling?/Ódio, que em uma palavra: muito divertida... droga, foram duas. Detalhe para o coral e a dinâmica de vozes no final.

Um padrão repetitivo no sopro e sinos constrói o início de History Lesson, e no meio da faixa, nas cordas, um novo motivo surge. Enquanto Dillamond conta sobre a opressão com os animais, os metais se juntam a ele quando a mensagem aparece no quadro, a faixa segue com uma variação do motivo nas cordas de forma melancólica e vai clareando conforme avança, retornando com a ideia final de How to Loathe Your Roomate. Levitate the Coin volta ao tom mais sombrio, com o coro monossilábico e as cordas com o tema da Morrible. Os sinos e as cordas se agitam, o sopro acompanha a moeda enquanto ela começa a voar, e o tema da Morrible sai do tom sinistro uma última vez.

Algumas músicas têm inserções da trilha nela, no caso, Something Bad/Algo Mau, que está dentro de uma faixa do John Powell. Mantendo o tom da faixa anterior, a harpa e as cordas começam em um ostinato, dando espaço pra melodia da música (so nothing bad, nothing all that bad...), que por si só transiciona pro ostinato inicial da música. A orquestra grita, interrompendo a música, na harpa o tema de Morrible toca enquanto Elphaba e Dillamond conversam sobre o responsável sobre o quadro, e as cordas retornam ao ostinato da música. No filme, a parte final dela não é cantada, mas a trilha continua como se tivesse sido gravada.

Um crescente familiar das trilhas de Powell iniciam Prince Fiyero of Winkie County, e uma ideia começa a se repetir nas cordas e se mistura a reprise da citação de No One Mourns the Wicked de Our Heroes Meet. Nos metais, de forma nobre, a melodia principal de Dancing Through Life desencadeia um frenesi com direito a bateria e coro na melodia de Dear Old Shiz. Um arranjo romântico nas cordas com a melodia de Dancing Through Life segue pelo resto da faixa, indo para piano e depois xilofone, e termina com os sinos da Glinda. The Book Place continua com Dancing... nas cordas e piano, acompanhado de pandeiro, o motivo da Glinda entra suavemente nas cordas e agora é a vez da melodia de Dear Old Shiz soar nobre nos metais, com a última nota descendo em desânimo.

A música que já era grande no álbum, no filme é maior, e entre ela ainda tem uma expansão instrumental de What Is This Feeling? que leva a reprise em Dancing Through Life/É Só Dançar, o final dela não é dela mas sim de Ozdust Duet, que rearranja pra piano a melodia enquanto Elphaba e Glinda... bem, só dançam. Entre as duas, tem Elphaba at Ozdust, bem atmosférica e melancólica, as cordas sugerem a melodia de Something Bad, o coro e o piano continuam a melancolia até as cordas crescerem pro tema da Bondade.


Sharing Secrets começa com a melodia de I'm Not That Girl enquanto Elphaba e Glinda se aproximam (Powell shippa, aparentemente), transicionando em cordas melancólicas para a harpa, repetindo as 5 notas que iniciam Ozdust Duet. As cordas entram com uma melodia de What Is This Feeling? (every little trait, however small...), em um tom sereno, terminando com o motivo da Glinda (os Lá, Lá), levando diretamente pra Popular, que também tem uma faixa entre ela, continuando na melodia da música nas cordas. Quando as duas estão se olhando no espelho, Powell traz de novo I'm Not That Girl (ele shippa mesmo), as cordas prenunciam For Good novamente e segue para o final da música.

Muitos vestígios em Replacement Teacher, de Popular ao início, com uma flauta no estilo idade média, com um pouquinho de I'm Not That Girl, seguindo com a percussão para o tema da Morrible, e então do tema da Bruxa Má. O sopro e percussão acompanham a cena, com toques dos metais pontuando ações até acelerar e crescer em uma leve explosão, com o coro e cordas desacelerando enquanto os alunos caem no sono com as Papoulas. Cub Rescue recupera o ritmo com cordas crescentes e um motivo similar ao da Bruxa Má em O Mágico de Oz.

A tranquilidade assume em Forest Feelings, com sinos e piano, pegando do arranjo de Dancing Through Life de Ozdust Duet, e seguindo pra o desenvolvimento da melodia de I'm Not That Girl/Não é Pra Mim, até de fato, ir direto para a intro dela e começar a música. E não acabamos com ela, porque 3 faixas futuras a citam, mas antes disso o ostinato de Unlimited inicia Ozian Invitation, que com o coro nos traz outro prenúncio em arranjo de caixinha de música, dessa vez de Wonderful. A orquestra retorna, e com ela The Wizard and I, uma estrofe inteira dela (and one day, he'll say to me: Elphaba...). A harpa faz a transição para o tema da Morrible no arranjo mais heróico. 


A orquestra inteira se une à celebração no começo de Galinda Becomes Glinda, reprisando uma ideia lá de Meet the Faculty. As cordas em staccato e os sinos, alternando com o sopro que também servem de contra ponto, tocam a melodia de I'm Not That Girl, a ideia inicial retorna no piano, e as cordas aceleram e param comicamente sinalizando a mudança de nome da Glinda. Não perdendo tempo, Train to Emerald City inicia com I'm Not That Girl uma última vez na maneira usual, seguido do rearranjo do segmento de What Is This Feeling? de Sharing Secrets, oficialmente se tornando um motivo para Glinda e Elphaba, transicionando nas cordas para um trecho de No One Morns the Wicked (Goodness knows, the wicked's lives are lonly...) quase como uma ironia. Em um arranjo bem emocionante, o sopro balançante leva a orquestra a crescer pra um novo prenúncio em Thank Goodness (we couldn't be hapier).

Mas ainda não escapamos de I'm Not That Girl, porque antes de One Short Day/Venha Ver realmente começar, há uma reprise dela, mesmo que tal trecho não esteja no filme. A música em si possui uma ideia pro Grimmerie que Powell não usou por algum motivo. Pra abrir o Hall of Grandiosity, Powell reprisa a melodia principal de No One Morns the Wicked em tom de maravilhamento, interrompido brevemente pelo ostinato que é o motivo dos Macacos Voadores (no momento, só macacos), o coro adentra e as cordas vão para o tema do Poder de forma temerosa e se junta brevemente com o ostinato (nos metais agora). Outro ostinato continua a faixa, no piano e nas cordas, o sopro entra com Unlimited e a orquestra se une pra For Good. O coro cria tensão e mistério, quebrado pelas cordas em pizzicato quando o Mágico se revela. A Wizard's Plan não é tão intrincado tematicamente — começando com variações de The Wizard and I, a faixa resgata o senso de maravilhamento com o coro e cordas suaves. Ao fim, o tema da Bondade retorna no sopro, indo para Unlimited e terminando com os metais. Daí temos A Sentimental Man/Sentimental.

O tema da Morrible em sua forma usual abre The Grimmerie, as cordas voltam lá pro crescente que começou o filme e o coro feminino canta o motivo do Grimmerie, um tanto macabro, mas imponente, similar a um de seus temas para Solo (em tom, não em escrita), mas um senso de dever retorna com os metais e a orquestra. O sopro começa a gigante Transformations, unido pelos sinos e depois as cordas, cautelosamente incluindo uma nova camada enquanto Elphaba se aproxima de ler o Grimmerie. A percussão e os metais graves se tornam mais pronunciados e crescem, o coro se une e explode pra calmaria antes de retornar como filme de monstro, o tema dos Macacos Voadores desesperado no meio da bagunça até Unlimited nos metais clarear um pouco as coisas se juntando ao ostinato e terminando no sopro caindo junto com Chesterie. A percussão retorna com o ostinato a escala da transformação ser descoberta, a harpa leva a faixa à calmaria de novo, mas as cordas ao fundo não deixam cair a tensão. Mas do que pontuar o que acontece em tela, a música aqui pontua emoções, então o tema da Bondade clama em desespero junto com Elphaba, em seu arranjo mais parecido com o trecho de No One Morns the Wicked que a originou, o tema da Morrible suavemente nas cordas responde e a nota no piano que começou o filme mostra a conclusão da Elphaba. Aquela ideia de History Lesson retorna em realização, pode muito bem ser um motivo para Injustiça, levando em consideração sua similaridade com o tema da Bruxa Má e da Morrible. Os metais pontuam a fala de Elphaba e as cordas voltam à melancolia, juntamente com o coro. O tom cresce mas a percussão leva a outro rumo com o coro masculino e uma ideia similar ao tema do Drago de Como Treinar o Seu Dragão 2, o tema da Morrible no arranjo mais sombrio até agora encerra a faixa.

Momento da ação, o tema dos Macacos Voadores infesta Monkey Mayhem e Powell faz o melhor que sabe fazer ao usar o poder da orquestra pra acompanhar o caos, e não só ela, como o coro também. Nos metais, o tema da Bondade e do Poder aparecem desesperados e o ostinato dos macacos se torna o de Defying Gravity enquanto o balão do Mágico sobe, nas cordas o tema da Bruxa Má soa como estivesse se esticando pra subir (é engraçado eu antropomorfizar música, mas ouve só, parece mesmo) e a orquestra se torna cada vez mais heroica antes do coro ir para tragédia com o tema do Poder.

Não sei de quem foi a ideia de cortar Defying Gravity/Desafiar a Gravidade em 4 pedaços, mas isso deu a Powell 5 faixas pra complementar a música. Continuando a tensão da faixa anterior, Powell faz uma mini transição para o começo da música, que ao concluir o trecho com o tema da Bruxa Má, leva para Powell, crescendo em uma ideia rítmica. O coro dá sinais de Something Bad antes de chegar ao ápice junto da orquestra, deixando somente as cordas que levam para a música novamente com o tema da Bruxa Má. No filme, há um silêncio entre essa parte da música e a próxima faixa de Powell, que começa com For Good no sopro antes de ir pro tema da Bondade nas cordas. Os metais tocam o tema da Bruxa Má como um lembrete e as cordas vão  para o motivo da Injustiça. Powell transiciona para a música com o ostinato de Unlimited, que reprisa e vai para o coro de Defying Gravity, então o tema da Bruxa Má conecta música e trilha novamente, com uma atmosfera e o piano no tema da Bondade, no mesmo tom de Ozdust Duet. A percussão entra ao fundo e cresce com toda a orquestra pro tema da Bruxa Má, uma cópia descarada de This is Clark Kent do Hans Zimmer que chega a ser engraçado, mas voltamos a música por menos de um minuto. A ação retorna com as duas primeiras notas de Unlimited, e as cordas no meio da percussão e metais com o trecho que acabou de tocar da música (I hope you're happy...) logo antes do coro retornar ao motivo da Injustiça e o crescente da última parte de Defying Gravity dar uma enganada no ouvinte. As cordas tremem, e o sopro leva à calmaria. Com o tema da Bondade uma última vez no coro, a orquestra cresce para levar ao fim de Defying Gravity. A música em si inclui uma inserção de Unlimited e uma extensão do final que parece emular o fim de algumas trilhas de John Williams (E.T., Império Contra-Ataca).

Acho que deu pra ver que gosto do John Powell? Se não ficou claro, gosto muito do John Powell, acho que não tem ninguém trabalhando hoje que combine tão bem o conhecimento geral de uma orquestra (não se ouve muita gente usando sopro nessa extensão mais), o som épico não processado e uma coleção de temas memoráveis, o homem só é bom demais.

Quando se trata de Wicked, muito do que se fala são só das músicas e, se a trilha for mencionada, é sobre como tal melodia de uma música apareceu, mas o buraco é mais embaixo, como espero ter conseguido exemplificar. Não sei exatamente quão grande foi a influência de Schwartz na trilha, suas músicas são a base de muitos dos temas originais, mas a composição não poderia ser mais Powell. Tirando algumas breves menções de músicas do Ato 2, a trilha focou um bocado nas melodias do 1º ato, vai ver, quem sabe, alguns dos novos temas sejam as duas novas músicas que a Parte 2 terá...

Mas isso é conversa pra outra trilha. Teremos outro encontro nesse ínterim? O término da série do Arrowverso? Outra trilha de Star Wars? Outra trilha do John Powell? Como todo bom musical, seja lá quando uma trilha me animar tanto pra me convencer a escrever sobre.

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