EXISTE INTEGRAÇÃO SURDA NO ENTRETENIMENTO BRASILEIRO?

 Hoje, dia 26 de Setembro, é o Dia Nacional dos Surdos, instituído para celebrar e conscientizar a inclusão da comunidade surda no Brasil, e já era hora de, em um blog que tanto milita sobre diversidade e inclusão no entretenimento, falarmos sobre esse grupo tão marginalizado PRINCIPALMENTE no audiovisual.

Há um tempo, realizei na universidade uma pesquisa pública sobre a presença de surdos nos espaços de entretenimento no Rio de Janeiro, respondida em sua maioria por ouvintes, mostrando como dificilmente pensamos o mundo de forma acessível quando não nos convém.

Nos cinemas, por exemplo, a forma mais comum de se pensar acessibilidade para surdos são as sessões legendadas. Mas você sabia que filmes nacionais não são ofertados com legenda — lógico, se assume que todos em território nacional falam português — assim como animações, mesmo internacionais, na justificativa de serem filmes infantis, e crianças não assistem à filmes legendados. Há ainda as redes de cinema nas cidades do interior, que para economizar, ofertam apenas sessões dubladas até mesmo de filmes internacionais!

Por mais que sejam espaços públicos, onde todos são permitidos, os cinemas não são democratizados, e nem todos são bem-vindos. 

Há aplicativos ofertados pelos cinemas que disponibilizam CLOSED CAPTIONS no celular do usuário, mas forçar um pagante a utilizar seu próprio celular e tirar sua atenção do telão do cinema nunca vai se incluir na definição de acessibilidade.

Um ambiente ainda mais elitizado que o cinema é o teatro, onde dificilmente encontramos espetáculos interpretados em LIBRAS, mesmo com os valores exorbitantes dos ingressos.

Enquanto não há uma melhora nas ofertas de sessões legendadas e interpretadas, a comunidade surda não tem muita opção a não ser esperar a chegada desses filmes ao streaming para a oportunidade de receber um pouco mais de acessibilidade ao consumir cinema.

É de se destacar o atual trabalho da HBO MAX, que tem disponibilizado versões em LIBRAS (e em ASL American Sign Language  no catálogo americano) dos filmes da Warner Bros. Discovery que são sucesso de bilheteria!

No cinema independente brasileiro, há muitos filmes ofertados em LIBRAS de forma gratuita através do YouTube, como o espetacular Capitão Astúcia (disponível também em audiodescrição, para cegos) e os Cine Gibis da Turma da Mônica. E outro espaço que é surpreendentemente inclusivo quando se trata da comunidade surda, são as igrejas. Não apenas nos seus templos físicos, mas nos seus diversos canais de comunicação na televisão aberta, fechada, no streaming e na internet.

Capitão Astúcia (2022)

Hoje, a mídia de entretenimento mais inclusiva no Brasil (se não fosse pelo assassinato que tem sido cometido com as bancas e a elitização/monopólio das comic shops, mas isso é assunto para outro artigo) seria a indústria dos gibis, que são ofertados em diversas línguas. Não apenas inclusiva para consumir, mas para se sentir incluído. São diversas as BOAS histórias sobre e para pessoas surdas.

A série do Gavião Arqueiro, escrita por Matt Fraction e ilustrada por David Aja, mostra as dificuldades do personagem, que é surdo, ao trabalhar sem seu aparelho auditivo, além de conter diversos quadros de Clint Barton se comunicando em ASL. A deficiência auditiva do herói demorou 10 anos para ser adaptada para o UCM, mas foi traduzida  para a série solo do personagem no Disney+ com ele começando a aprender a língua de sinais americana e introduzindo Maya Lopez, a Echo, interpretada por uma atriz de fato surda e amputada.

A série da Echo foca muito na surdez da personagem e entrega todos seus momentos importantes através da língua de sinais, forçando todos os ouvintes, independente de estarem assistindo dublado, a acompanharem através de legenda.

Mais recentemente, a edição #1100 do quadrinho Detective Comics, por Tom Taylor e Mikel Janín, acompanha o Homem Morcego atendendo uma criança surda, e é inteiramente contada através do ASL, conversando muito mais com os leitores adeptos à cultura surda do que os leitores típicos.

É de extrema importância que questionemos se, em nosso círculo, a falta de pessoas surdas se deve, na realidade, à falta de acessibilidade, e não à falta da vontade da comunidade estar nestes espaços. Felizmente, a cultura nerd está cada vez mais inclusiva, dando espaço para que toda minoria se veja em suas histórias preferidas, mas se faz urgente a atenção dos espaços públicos de entretenimento.

Texto de Tiago Samps;

Revisado por Fernanda “Ferbs” Pinheiro.

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