Scott Pilgrim... fora de cena? | REVIEW QUE NINGUÉM PEDIU

     


    Oi, talvez a gente não se conheça tão bem (o que é totalmente um erro da sua parte porque eu já estive aqui antes), mas pra quem não me conhece, meu nome é Carly, anteriormente conhecida por um nome que não é da sua conta, mas acima de tudo eu sou a maior autoridade que há no Brasil quando o assunto é Scott Pilgrim, e por isso hoje eu vou ser a sua guia!

 - ATENÇÃO, ESSA REVIEW CONTÉM SPOILERS -

    Scott Pilgrim, talvez uma das histórias mais emblemáticas a abordar o tropo de 'garoto conhece garota' para toda uma geração, também é um história em quadrinhos escrita por Bryan Lee O'malley, lançada de forma independente mas que já recebeu diversas adaptações diferentes, seja na forma de um videogame, curtas animados ou um filme live-action que talvez seja sua versão mais famosa. Agora, recebe um anime produzido pela Netflix em parceria com o estúdio de animação japonês Science SARU e é dele que falaremos agora.

    Sendo direta ao ponto, a série animada está longe de ser apenas uma adaptação que vai te contar a mesma história que você já leu, assistiu ou jogou. Desta vez, serve muito mais como uma releitura da obra original que te entrega uma narrativa nova baseada na ideia de "e se isso tivesse ocorrido diferente", dando muito mais espaço para que personagens que ficaram de escanteio em outras versões tenham seu lugar ao sol, enquanto dá a Ramona Flowers o papel de personagem central.

O núcleo da Sex Bob-omb

    O primeiro episódio funciona como uma adaptação bem fiel do volume 'precious little life', porém partindo do pressuposto de que você já conhece parte desses personagens, se distanciando bem rapidamente do núcleo da banda para se focar no romance que Scott tem com Ramona como forma de preparar o terreno para o final do primeiro episódio onde temos a reviravolta que justifica o nome original da série: Scott Pilgrim perde o combate e é morto por Matthew Patel, balançando completamente o rumo que a história poderia tomar e dando o papel de protagonista para Ramona Flowers, que se envolve em uma conspiração em torno da possibilidade de seu ficante estar vivo ou não.
    
    A série lida muito bem com a ideia de ser uma nova versão da história que já conhecemos. Ao mudar o foco da história para Ramona, não apenas passamos a entender melhor as ações da personagem no original como podemos conhecer um outro lado não explorado que acaba sendo o trunfo desta versão: os ex-namorados.

    Ao manter um formato episódico, 'Scott Pilgrim: A série' decide abordar cada um dos sete ex-namorados de Ramona Flowers, intercalando-os e mudando a proposta inicial de fazer com que Scott os derrote para dar lugar a histórias mais íntimas que se aprofundam bem mais em cada um e no seu relacionamento com Ramona. Mostrando assim, mais sobre como eles se sentem sobre ela e o porque de entrarem para a Liga em busca de vingança, pondo nossa protagonista contra a parede e a fazendo questionar seus relacionamentos passados e até o que ela deseja construir com Scott.

Cinco dos Sete ex-namorados da Ramona.
    
    Com o desaparecimento de Scott e a rápida resolução de que agora os ex-namorados não tem mais motivo para antagonizar a vida da Ramona, são criadas novas narrativas baseadas no mundo de Scott Pilgrim e na interação desses personagens sem a presença do antigo protagonista, dando mais chance para eles se destacarem e criando a sensação de que o mundo está mais vivo e independente.

    Um ótimo exemplo disso é Knives Chau, que agora apresenta uma maturidade bem maior que no original, seguindo sua vida após a morte de seu ex-quase namorado, se resolvendo emocionalmente com Ramona e tomando iniciativa em diversos momentos de forma totalmente independente, deixando para trás a imagem de 'garota de 17 anos surtada' que ela tinha no material original.

    A série também é muito mais livre para explorar a sexualidade dos personagens como em um mini arco secundário protagonizado por Wallace Wells, onde nosso vegano favorito se apaixona perdidamente pelo nosso homossexual alcoólatra, declarando que Wallace é a primeira pessoa que ele amou de verdade (ignorando a existência de Envy adams e Ramona Flowers).

    

Knives Chau, Julie Powers e Ramona Flowers

    A arte do anime é linda, e se aproveita dos diferentes elementos estéticos que foram construídos ao longo das diferentes mídias pelas quais a história já passou, ao mesmo tempo que cria sua própria direção artística que toma inspiração de gêneros como o punk-rock, grafite e old school.

    A animação é fluída na maior parte do tempo, e prova que a decisão de entregar esse trabalho ao estúdio Science SARU foi uma decisão mais do que certa, com sequências que não tem medo de experimentar diferentes técnicas e combates que te fazem arregalar o olho com a fluidez dos movimentos.

    O elenco de vozes está absolutamente confortável em seus papeis, entregando bem mais carisma e personalidade que no próprio filme. porém em alguns momentos fica nítido que nem todo ator sabe dublar profissionalmente, o que acaba criando um certo vácuo de qualidade nas vozes dos personagens. Coisa que não ocorre na dublagem em português da obra, que possuí uma diferença de qualidade absurda quando comparada ao original em inglês.

    Na trilha sonora, ANAMAGUCHI e Joseph Trapanese criam juntos uma experiência única, com músicas que te fazem sentir como se estivesse assistindo um grande video-game e se comunicam de forma excepcional com todos os outros elementos da obra.

    A seleção de músicasl licenciadas é talvez ainda melhor que as do primeiro filme, explorando diferentes gêneros para expressar melhor os personagens, indo desde o synth pop japonês até o garage rock noventista.

    

    Indo Para o que talvez seja o ponto mais polêmico, vamos falar sobre a sua segunda reviravolta, que ocorre ao nos aproximarmos do final da obra: A série animada não se trata de um 'what if...' ou de um remake, mas sim de uma continuação dos quadrinhos em uma história que envolve um Scott do futuro que passou por tudo que ocorreu no original e agora está amargurado com uma eventual separação mal resolvida com Ramona e se torna o principal antagonista da trama numa tentativa de fazer com que eles nunca tenham ficado juntos a princípio.

    Isso deixa óbvio a principal mensagem da obra ser sobre o encerramento de ciclos, com os personagens ao longo da trama tendo que encarar seus piores lados com grande frequência e aceitar suas falhas para entender o próximo no lugar de só buscar a saída mais fácil, mostrando que conflitos em relacionamentos são muito mais do que só preto no branco.

    Com isso, o final de Takes Off acaba sendo pessoalmente o meu favorito entre todas as versões, por sentir que pela primeira vez os personagens conseguiram de fato superar suas mágoas e compreende-las, dando um gosto muito mais doce na boca e uma sensação de ciclo fechado, enquanto ainda brinca com a possibilidade de uma nova história nesse universo.


VEREDITO: ★★★★★

    Vale a pena assistir? Definitivamente sim! porém eu recomendo ter contato com o quadrinho antes pois assim você consegue ter um aproveitamento melhor da história enquanto entendo mais sobre o mundo e esses personagens.




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