Vivo ou Morto: Mais um BOM Mistério 'Knives Out' | REVIEW QUE NINGUÉM PEDIU

 Filmes de Natal não necessariamente precisam ser sobre o Natal, né? Duro de Matar e Batman: O Retorno, por exemplo, apenas se passam durante o feriado. Mas há também aqueles filmes que dispensam temática e ambientação, mas permanecem nas tradições natalinas pela prática de ser lançado, e consequentemente assistido, no período natalino, em Dezembro. Star Wars já foi esse tipo de filme, Avatar poderia ser se os intervalos entre as sequências não fossem tão longos, mas a Netflix trouxe os candidatos perfeitos: Os Mistérios Knives Out.

Criada pelo diretor Rian Johnson (Star Wars: Os Últimos Jedi), a franquia é uma antologia de mistérios acompanhados pelo detetive Benoit Blanc, interpretado pelo excelente Daniel Craig (007), com a proposta de histórias isoladas, com tons e elencos completamente diferentes a cada filme. 

O primeiro, Entre Facas e Segredos (2019), não levanta necessáriamente a pergunta de quem cometeu o crime, visto que somos apresentados a ele como um acidente, enquanto o segundo, Glass Onion (2022) nos embola nas motivações que cada suspeito pudesse ter. Embora em ambos o culpado seja óbvio, a construção e a entrega são o que fazem tais filmes tão divertidos de se (re)assistir, além dos detalhes que se perdem à primeira vista que se tornam completamente óbvios em uma segunda assistida.

Vivo ou Morto, lançado no início deste último mês de 2025 na Netflix (que infelizmente ficou um curto período de tempo nos cinemas, e não fomos convidados para experienciar pois a vivência cinematográfica não parece ser um dos apreços da tão amada "Netinha"), é o terceiro e mais diferente destes mistérios, colocando Benoit Blanc dentro de uma comunidade católica pequena, mas muito conturbada, a fim de provar a inôcencia de mais um infeliz e ingênuo suspeito: Padre Judge (Josh O'Connor).

O que faz deste o mais diferente dos 3 filmes é a abordagem mais intima de Benoit Blanc, que se justifica no contexto pessoal de Rian Johnson, que cresceu em meio cristão e coloca no roteiro, tanto no detetive, quanto no Padre suspeito do assassinato, suas ponderações, dúvidas e esperanças sobre a relação de Deus para com a humanidade, seu plano maior e sua agência. Tais nuances tão pessoais fazem com que os personagens sejam mais profundos e interessantes de se acompanhar, fazendo também com que os suspeitos fossem um pouco menos (embora ainda fosse um pouco, para aqueles com o costume de assistir e solucionar filmes de mistério) óbvios.

Ainda sobre a familiaridade do diretor com a estética católica, que é muito bem refletida na forma que o filme é gravado principalmente dentro das paredes da igreja, o filme tem uma identidade muito distinta dos dois anteriores, fortalecendo a proposta da franquia de servirem como obras singulares que podem conversar com públicos diferentes. O trabalho com as luzes (assim como a falta dela) ajudam a contar a história, e entregam quais personagens estão mais próximos ou afastados de Deus, o que não necessariamente diz sobre sua culpa dentro do caso, mas sim sobre seus estados pessoais e suas próprias motivações dentro da história — como o próprio Benoit, que por vezes é representado antagonicamente à figura da cruz, mesmo sendo uma figura benéfica dentro da trama.

Contando com nomes estelares como Jeremy Renner (Gavião Arqueiro), Josh Brolin (Vingadores: Guerra Infinita; Duna) e Glenn Close (qual é, preciso te dizer quem ela é?), Josh O'Connor (Rivais) entrega emoção que pasme (ou não) também vem de um passado pessoal de religiosidade, sendo o "sidekick" de Blanc com mais camadas até então, podendo muito bem ser um dos culpados.

O filme também aborda, de forma muito aberta, a influência da religião no meio político, com a utilização das redes sociais como ferramentas para manipulação de narrativas e o controle sobre os fiéis para a obtenção de interesses pessoais e econômicos.

É muito difícil falar e discutir sobre Vivo ou Morto (e qualquer filme de toda a saga Knives Out) sem pisar em algum spoiler da trama, principalmente por cada pequeno detalhe no decorrer da história ajudar no desenrolar da reviravolta, mas é fato que todo amante de mistério, das clássicas leituras de Agatha Christie às (em sua maioria terríveis) adaptações de Sherlock Holmes, é um possível novo amante dessas criativas novas obras de Rian Johnson. Fãs de cinema num geral — aqueles que estão no meio termo entre letrados o suficiente para entender composição de cenas e a utilização de cores na fotografia, mas civilizado o suficente para não exigir reinvenção de roda de cada produção — também são um alvo fácil pra essas 2 horas de puro entretenimento bem escrito, dirigido e performado.

VEREDITO:  ★★★★

Embora sabotado pela Netflix em sua janela cinematográfica, que merecia muito mais tempo, Vivo ou Morto também é um bom filme para se assistir no sofá, com sua família, seja para resolverem o caso juntos ou para levantar, em plena ceia de natal, o questionamento se o pastor, padre ou reverendo da sua igreja é, de fato, um servo do Senhor ou um aproveitador de benefícios ofertados pelo cargo sacerdotal.

Texto por Tiago Samps

Revisão por Fernanda "Ferbs" Pinheiro 

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