O Capitão América não representa os Estados Unidos!
Capitão América: Admirável Novo Mundo está entre nós há uma semana e, apesar dos diversos defeitos que apontamos na nossa review (que ninguém pediu), um aspecto do filme é claro e factual: Anthony Mackie e Sam Wilson incorporam perfeitamente o que o herói representa!
Com um codinome tão claro (e militar) e a estrela e listras estampadas em seu traje, o “Capitão América” pode soar muito como um herói que representa os valores dos Estados Unidos da América quando, na verdade, em toda a sua história, tem sido usado para contar histórias que desafiam o patriotismo conservador e vai além de fronteiras nacionais.
Anthony Mackie entendeu isso perfeitamente, e antes mesmo do filme estrear disse em uma entrevista durante a turnê de divulgação do filme que o herói “representa muitas coisas diferentes”:
“E eu não acho que o termo ‘América’ devia ser uma dessas representações. [...] É sobre um homem que mantém sua palavra, que tem honra, dignidade e integridade. Alguém que é confiável."
Obviamente, essa fala do ator causou um alvoroço na internet, com os estadunidenses (e até alguns brasileiros, obviamente, os patriotas) achando um absurdo a ideia de que um super-herói devia agir com um bom caráter acima dos interesses de um governo – afinal, é óbvio o que Mackie quis dizer com “não representar a América”, né?
Engraçado que até mesmo Chris Evans tinha o mesmo entendimento sobre o personagem! Em 2011, em uma entrevista que deu para o site comicbook.com durante a divulgação de Capitão América: O Primeiro Vingador, o ator de Steve Rogers declarou:
“Esse não é um filme para balançar bandeira. É vermelho, branco e azul, e acontece que o personagem foi criado na América durante um período de guerra quando havia um inimigo em comum." Evans acredita que embora o personagem vista a bandeira americana, ele foi criado mais para se opor ao mal inegável do que promover nacionalismo, e que “Ele podia se chamar só Capitão Bondade”
Essas opiniões tão parecidas, com quase 15 anos de distância uma da outra, não são acidentais. Simplesmente ambos os atores leram o básico das histórias do Capitão América (tanto Steve Rogers, quanto Sam Wilson) e entenderam o que até os filmes deixam sempre muito claro: é a bondade que faz de um homem um real super-soldado.
Não faz sentido bater na tecla de que o Capitão América “serve aos Estados Unidos” quando na Guerra Civil (tanto nos quadrinhos, quanto no UCM) Steve Rogers se opôs ao governo.
Diversas são as histórias em que Steve Rogers faz completa questão de evidenciar que tudo que faz, faz pelo que o sonho americano deveria ser: verdade e liberdade. Justamente por isso, Rogers luta pelos imigrantes que fizeram da América o que é hoje. Luta pelos nativos que estavam nessas terras antes dos colonizadores. E sempre vai se opor às atitudes colonialistas do governo Estadunidense.
Sam Wilson obviamente não fica pra trás nessa questão, trazendo camadas ainda mais profundas nas histórias do título Capitão América ponderando como uma nação tão racista reage a um homem negro (mesmo que americano) representando a estrela e as listas.
Recentemente, em United States of Captain America (2021), a Marvel Comics ainda foi além, criando um conjunto de personagens de diferentes estados dos EUA que decidiram assumir o manto de Capitão América e lutar pelos mesmos ideais que Steve e Sam representam. Indígena, caipira ou homossexual. Preto ou branco, homem ou mulher, qualquer um pode ser o Capitão América, e não depende de governo algum para lutar pelo que é inegavelmente certo, seja nos Estados Unidos ou em qualquer lugar do mundo.
Nem sempre um personagem é tão “raso” quanto parece. Sequer é a primeira vez que precisamos explicar o que um herói ”representa” por conta de percepções erradas do público, que facilmente não existiriam caso lessem algumas histórias clássicas – ou, simplesmente, prestassem atenção nas adaptações.
Texto de Tiago Samps
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